segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Sentimentos periféricos

Subúrbios de um dia qualquer
Solidão que está doendo à horas
Desvio do olhar ao distante
Momentos supérfluos para quem já não ama.
Nos passos delgados da incerteza
Diz-se um pouco do nada da nobreza
Mas só é nobre quem ainda tem algum sentimento
Um notório show de bater palmas...
Fingir para alguém e deixar só
Novamente se pensa nos subúrbios.
Tão devasso e esquecido na biboca dos males
Pobreza de espírito dormente
Já se foram os dias em que se podia pedir chuva
Antes era mais simples...

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Soneto de uma valsa

O salão todo iluminado
Inicia-se uma música bela
Sendo que aquela
É a valsa de um apaixonado

Ele espera um certo momento
Que parece ser eterno
Num calafrio de inverno
Mas ela vem com o vento

Ele a pega pela mão
A corteja bem devagar
Leva-a para o meio do salão

E num sonho começa-se a dançar
Acompanhando as batidas do coração
E dizendo pra sempre te amar.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Soneto curto

Num dia qualquer
Com chuva fria
A cabeça doía
Por causa de uma mulher

Tomou um remédio
Na rede deitou
O vento soprou
E quase morreu de tédio

A chuva foi embora
A dor ainda dói
E agora?

O moedor mói
Namora quem come amora
E então a ferrugem corrói.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Soneto poetizado

O poeta abriu seu livro sobre a mesa
Escolheu entre tantas uma caneta
Esboçou um borrão de letra
E escreveu algo para uma tal Maria Teresa

O que ele escreveu bem lá não se sabe
Mas está convicto do que quer alcançar
Pôs as palavras para entrelaçar
Pelo menos até que o poema acabe

E o fim está chegando
As rimas estão para se terminar
O livro está se fechando

Surge a última frase antes de tudo se acabar
E ela diz a tudo que está ventando:
“Teresa eu sempre vou te amar”.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Frio de inverno

Saudades de alguém que digo não ser muito mais do que tudo...
Profundo do mundo num só ser...
Andei vagando uns dias que nunca mais recordamos...
Dias frios, pois no inverno não há muito calor.
Mas, possa que haja haver amor.
Bem, andei num andar vago,
Buscando me livrar do sabor amargo,
Um certo sabor amargo que não continha nada mais que desejo
Desejo no viver cansado de buscar, calado,
A morte do dia e a noite no seu nascer pontilhado.
As trilhas que não se pode percorrer ainda estão intactas.
Quem sou eu para desafia-las?
Um mero nada escondido nisso tudo!
Mas as saudades se unem num único horizonte...
Horizonte meio escuro-claro...
O contraste ainda se fazia notar
nos riscos e rabiscos  das sombras de um papel sombreado.
Seria confuso, complicado e até desnorteante;
Mas eu ainda conseguia me lembrar de seu rosto lindo...
Dizendo-se lindo por ocasião de que não se perde os olhos de anjo.
Assim também se vê a auréola da eterna inocência,
Que de tempos em tempos se procura uma luz que brilhe mais que o sol.
As horas estão indo e vindo, findo.
Não tenho muito tempo pra dizer adeus,
Talvez isto seja apenas para os fortes...
Dizer adeus...
Ela ainda me espera?
Nem sei mais do que deveria esquecer
E que não se pode corrigir e nem emendar em um novo sentimento.
A saudade volta... nunca se foi mesmo.
Quero é querer um pouco mais do que nem sei do que quero.
Desespero não é uma palavra que deve ser usada aqui,
Mas irei usá-la com mais frequência na minha vida mundana...
Mundana não...
Enfadonha...
Perdida...
Enegrecida por anos inglórios.
Eu não devia tê-la abandonado...
Amo-a demais e grito meu desespero pelos ares de todos os ventos.
No fim fico rouco de poucas causas que talvez eu não saiba valorizar.
Agora ainda não é tarde, mas é frio...
Frio de inverno...
Talvez seja mais uma desculpa para voltar atrás e tentar  te achar
Mas esse meu querer te achar é infindo?
Ainda não sei o que deixaria de ser...
As mãos gélidas que não possuem luvas rasgadas pelo carvão obscuro
Estão definhando num apodrecer congelante.
Creio que já estou amargurado porque quero
Mas possa também que seja uma ressaca do mar...
O mar está tão longe e tão inalcançável para mim
Não sei porque ele existe
Finge não estar, resiste
Vai e volta, insiste
Volta e vai, persiste.
Metáforas de dores que talvez não sejam tão dolorosas
Parece que o mundo roda e sempre roda sem se importar com o resto
Não se faz nada, dorme-se no relento
Eu grito: te amo!
Palavras mal usadas, em vão
Vento não morno nem tão quente que não possa ser confundido com frio.
De novo o frio...
Frio de inverno.
Talvez as memórias estejam num guarda-roupas antigo e corroído pelos cupins.
Eu a amo, é o que basta?

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Soneto miserável

No prato alguns grãos de arroz
O rosto meio amargurado
Na tristeza de tudo acabado
Com medo do que venha depois

Estes eram os últimos grãos que tinha para comer
A seca acabou com tudo o que possuía
Seu corpo então já percebia
Que restava pouco tempo para se viver

A poeira dizia em prantos
Que nem agüentava aquele calor
E os mortos debaixo de seus mantos

Refletiam da terra o seu sabor
Pedindo a todos os santos
Que os livre desta dor.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Um acontecido efêmero

Há momentos em que se deixa levar pelo vento
Num vento este de um ser sentimento
No peito da gente bate forte
Nesse querer bater tão de repente
Rápido, desnorteado e carente
Mas a carência diz se o porque
Um porque não se sabe explicar
Com esses dias na vida uma amizade
Daquele calar que faz bem e não tem saudade
Muitos se vão e poucos ficam
Ficando num canto de momentos únicos
Nestes momentos as dores vão embora
Fica-se só a boa hora
E muitos dias de um não clamor
Por fim se diz um amor
Aquele amor gostoso depois que o sol se vai
Ficam só as estrelas e um silêncio neste amar
Talvez só se aprenda a amar no dia em que não importa mais nada...
Tudo está bem se quem se ama está feliz
É como se o mundo precisasse daquele sorriso
Um sorriso e nada mais.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Num jardim está meu sonho

Acordei num desespero perdido
Numa vontade louca de viajar
Olhar pela janela, o sol nascendo
O coração batendo forte, mas tranqüilo
Vendo a vida correr pelos campos verdes
Com flores pequenas e perfumadas
Almas pedras ladrilhavam o mundo
Um mundo infindo e contínuo
Vontade de ir para um jardim
Encontrar meu ao pé de uma arvora
Sussurrar em seu ouvido: “eu estou aqui”
Vê-lo sorrir em pequenos gracejos não ditos
Depois olhar o pôr-do-sol
Lhe beijar de leve e esperar as estrelas surgirem
Ficaria nesse jardim para sempre
Pois o meu sonho está lá e tenho que ir encontrá-lo...

Cão

Amontoado num canto da rua. De longe pensava-se que era um de lixo. Passava horas assim, nesse canto. Considerava ali sua casa. Às vezes se dispersava com algum gato que lhe cruzava o caminho, uma das poucas ocasiões em que se movimentava com o fervor de um filhote. Mas logo se cansava e voltava para o seu lugar. Não passava fome. O dono do restaurante sempre deixava algumas sobras depois do almoço e do jantar. Sofria na chuva. Tremia no frio. Pior era frio com chuva. No verão o sol lhe torricava as orelhas. Gostava daquilo. E a vida continuava.
                Toda manhã ele acompanhava, como os olhos, aquele gente que tinha pressa. Não entendia o porquê. Imagina que estavam distribuindo comida à vontade. Mas não! Esses seres eram estranhos. Se alegravam com papel; o mais engraçado é que existiam uns bobões que trocavam esse papel por objetos grandes e muitas vezes bonitos. Que idiotas. Ria na sua risada mental. Passava a língua pelos dentes e depois tocava o focinho no chão. Encolhia-se todo, abanava um pouco o rabo, só para espantar as moscas e depois virava para o lado e dormia. Vida boa. Barriga cheia e um canto para dormir. Precisa de mais?
                De tarde resolvia dar um passeio. Nada grandioso. Uma volta no quarteirão ou, quando muito, subia o morro, mas só voltava depois de muito tempo, quando toda a fadiga se extinguia. Era neste horário que as pessoas voltavam para suas casas. Não conseguia entender o porquê que iam tão devagar e tristes. De manhã eram tão rápidas e... bicho estranho. Além de andar em duas patas, necessitava de uma outra pele para se aquecer, pois não tem pelo suficiente. Era impossível que vivessem tantos anos. Estranho, bicho muito estranho.
                Voltava para o lar e ficava ansioso para que o cozinheiro lhe levasse um pouco de comida. Não precisava de mais nada.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Desgosto do gosto

Sou uma pessoa que ama desgostando
Desgostando por amar, nunca querer odiar
Gostando pouco, às vezes muito
Fingindo não doer no desgosto
e carência no gosto
Pouco por pouco nessa esquecida desgostosura
Tendo muito ou nenhuma compostura
Vulgariza-se o gosto de sonhar
e o desgosto de acordar
Amo esse gosto de desgostar
Desgosto desse gosto de amar
Verbos do infinito me desgastam
num desgastar desse querer valorizar
Gosto do sal na boca
Desgosto da vontade de beber água que vem depois
Igarapés na curva pro rio
Um dia eu desgostei
e voltei a gostar de novo
Redesgostar...
*Dedico a Isadora Grubert

Perfume

Um leve beijo no rosto de um eterno anjo. Assim definiu aquele momento com uma certa mulher. Estava embriagado pelo sentimento dos que apreciam a lua, e muito mais que isso. Possa ser que se achava em seu paraíso pessoal. A terra não é o bastante. Era um aviador de impossibilidades concluídas. Que se achasse o tesouro mais valioso do mundo! O que importava?! Não precisava de mais nada... Ah, vida.
                E o dia foi festa. O chefe o mandou fazer o relatório da semana mais a ata da reunião. Tudo bem. Mais tarde o seu computador pegou um vírus que danificou a memória, fazendo com que perdesse o trabalho de três anos. Que dia lindo! Foi até maravilhoso rasgar a camisa no corrimão da escada do metrô.
                No sábado o reencontro tão esperado. Ela com um vestido verde esmeralda, o cabelo em um coque dourado, e aquele perfume de flores silvestres... Inesquecível. Sentou-se em sua frente. Pediram alguma coisa para comer. Beberam um vinho branco. Ele a olhou profundamente, como se quisesse fotografá-la com sua mente. O que foi? Os olhos o encarando, como se quisessem algo em troca. Nada. Ela sorri. Olha para baixo, finge um constrangimento, depois volta a encará-lo. Um leve tremor surgi em seus lábios. Para ele, tudo aquilo é único; não existe nada igual.
                As horas vão passando. Pra variar, a lua cheia surge. Cria sua luz para os apaixonados, ou apenas para clarear as idéias lunáticas; o mais certo é que controla a maré. Decidem caminhar um pouco. Ela olha para as estrelas, raras numa cidade grande e depois voltasse para ele. O breve silêncio antes do beijo. Devagar, imaginando que aquilo era a felicidade. O perfume dela fica mais forte quando ele toca a sua pele. É o seu êxtase. Vai lhe dominando lentamente, de modo que intoxica suas veias e o deixa com seqüelas irreversíveis. O que importa? Os olhos continuam fechados mesmo após o beijo acabar. Não precisa vê-la, apenas aquele perfume já lhe permitia saber o que realmente queria.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Preconceito

“Fernando”
                Esta voz lhe soou profundamente naquele êxtase de reflexão. Levou algum temo para se dispersar do que estava observando, e só depois é que conseguiu olhar para trás. Não havia ninguém. Talvez fosse apenas sua imaginação, sua cabeça estava cansada, oscilava para os lados. Sentou-se no banco. Esquecera da tinta fresca. Agora era uma preocupação tardia, mas já era bastante inconveniente reclamar de sua burrice. Soletrou alguma palavra, só por diversão, e depois cantou qualquer coisa bem baixinho. Um sussurro. E fim nisso. O celular tocou. Esperou o quarto toque e atendeu. Quem não era? A mãe, a tia, o avô. Sou eu, meu bem. O que você está fazendo? Acabei de acordar e não te encontrei, sabe? Sei. E aí resolvi te ligar para saber onde você está. Ah... E onde você está? Eu? eu estou aqui na praça, dando uma olhada no jardim. Vê se não demora que eu estou com saudade. Tudo bem, daqui a pouco eu já vou. Estática na linha. Guardou o celular no bolso. Olhou a camisa manchada e quis xingar. Xingou. A boca às vezes serve para alguma coisa, isto é, quando um homem não sabe o que quer.
                “Fernando”
                Levantou-se de uma vez. Estava ficando louco, não era possível! Duas vezes alguém lhe chama, mas quem seria? Meditou um pouco, O que havia esquecido aquela manhã? Não se lembrava. Mas parecia algo importante. Resolveu voltar para casa. “Fernando”. Mas que diabo! Quem era esse Fernando? Correu um pouco e lá veio “Fernando”. Estacou. Beliscou-se. Risadas. Ele é que era Fernando. E qual era o problema mesmo? Ah, sim. Alguém o estava lhe chamando e ele não sabia quem. Desesperou-se e meteu a cabeça num poste, Desmaiou, Acordou com uma baita dor de cabeça e foi embora. Chegou em casa. Nossa, o que aconteceu? está com a testa roxa! É que eu fui assaltado... Assaltado? mas como? Ah, ninguém têm mais respeito pelo próximo. Eu te avisei para não ficar andando por essa periferia; lá só tem bandido! Está bem, é melhor esquecermos isso... Não! vou ligar pra polícia e é agora. Não precisa... Precisa sim! e o que foi que eles roubaram? Foi aquele relógio que eu comprei no camelô. Mas ele está em cima da mesa, você o esqueceu pela manhã, eu acho. Não, mas foi o outro. Que outro?

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Soneto filosófico

Numa filosofia antiga
Se inicia um debate social
Com palavras do irreal
Joga-se xadrez na intriga

Surgi faíscas no embate de pensamentos
Cada um impõe sua razão
Dizendo ser sim ou não
Numa trama de regimentos

Na idéia iluminada
Tende-se a temer o resultado
Pois numa ação alucinada

O destino é atropelado
Alguma coisa diz-se renegada
Num discurso acabado.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Soneto desaconselhável

No indo findo vindo
Para aqueles que já bateram palmas
E deixaram de lado suas almas
Fiquem felizes pelos os que estão te traindo

Penumbra aos olhos doentes
Que não enxergam suas vidas
Para tudo estão esquecidas
Em seus corações dormentes

Mas as luzes piscam os chamando
O problema é que não querem ajuda
Nem quando estão se matando

O pecado é o que tem que os acuda
Nos momentos em que tudo está se acabando
Esperam por uma esperança que os iluda

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Incerteza de morrer

Por viagens que nunca fiz
Por vagar num círculo curto e infindo
Talvez por isso mesmo
Eu tenha aprendido a sofrer
Sofrer de um não querer gostar
Não sei mais o que é esse gostar
Perdi anos entendendo coisas supérfluas
E nesse perder, perdi a mim mesmo
Fui deixado para trás e adormeci
Talvez não tenha ainda despertado
Estou incerto disto
Possa ser que ainda estou dormindo
Assim quem sabe passou-se cem anos
Não posso saber...
Pedras negras caem sobre mim
Estou sendo esmagado
Sangue é só mais um líquido
Líquido este que se vai jorrando
Terra vermelha, quente e dura
Seca como a vida que tive
Vida que foi esquecida e esqueceu-se de gostar.


quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Soneto arquitetônico

Pensei em coisas que quero fazer
E quero beijar tua boca carnuda
Te deixar totalmente muda
E lhe fazer sentir prazer

Depois quero que seja minha namorada
Para no sábado te chamar pra sair
No domingo ficarmos juntos sem ter aonde ir
E na semana inteira dizer que é minha amada

Anos mais tarde quero te pedir em casamento
Ter dois filhos belos e saudáveis
Me aposentar em um certo momento

Realizar sonhos inalcançáveis
Comprar uma fazenda na colina do vento
E viver por você em dias amáveis.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Quando é hora de ir

As coisas se vão como o vento
e dói muito nesse num querer lamento
Sentir um descompasso do coração
Chorando numa velha e retida canção
Dias em que se pedi um abraço de velhas amizades
Para que possa se ver o sol de muitas idades
E num querer dizer
e num querer sorrir
Finge-se ser
Finge-se dormir
Sempre se ama, só que de formas diferentes


terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Soneto sonhando acordado

Sonho com campos esverdejantes
Em que nunca se canse um correr
Lá encontrarei o meu querer
Lá seremos dois eternos amantes

Quero dar-lhe várias flores
Enchê-la de beijos loucos
Que não serão poucos
Refletindo mais do que muitos amores

Deitar ao seu lado
Ficar te olhando
Num coração doado

E assim sempre te desejando
Meu pequeno rubi amado
Sempre e sempre sonhando.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Superioridade

Rabiscou um papel avulso. Algumas palavras desnorteantes, outras delirantes. Se achou o tal. Era o rei da cocada preta. Podia tudo. É. Daí rabiscou mais. Foi lá e desenhou o sol. Com isso trouxe a luz. Então quis sombra, com isso veio uma árvore. Descansou um pouco. Viu o que tinha feito e ficou feliz.
                De repente teve ares de imperador; então desenhou o mundo e um trono. Imaginou o que poderia fazer, querer e mandar. Poder. Um alucinóide fascinante. Fez uma coroa e colocou um gigantesco diamante nela. Foi lá e criou um escravo que fazia tudo por ele.
                Cansou-se de mandar. Era hora de tirar umas férias e pescar. Desenhou um peixe. Mas era pouco. Queria um cardume. Aí um tubarão apareceu, só que era meio cego. Então colocou uns óculos no bicho. Já era o cardume. O predador ficou só, mas a barriga estava cheia; é o importante.
                Criou um avião, pulou de pára-quedas e desenhou uma montanha. O avião bateu na montanha. Riu alto!
                Daí a Borracha foi lá e apagou tudo.  Acabou a festa do Lápis.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Soneto submisso

Querendo ter noções ostensivas de um nada
Em singela precariedade imortalizada
Fugas na honra de uma promessa feita
No sonho lunático da sinfonia perfeita

Seu cabelo desalinhando no efêmero vento
Nos passos curtos de um doce lamento
Muda-se a cor para se alcançar o além
Adormece na escuridão sofrendo por alguém

Ruas que vão a lugar nenhum
Vielas obscuras e engrandecidas pela dor
Paredes intocáveis na vastidão do inverno

Seixos estragam o não velado algum
Beijo a face de um anjo entorpecedor
Que me deixou no sôfrego amor eterno.

sábado, 21 de janeiro de 2012

Inteligência genética

O menino não sabia como iria mostrar aquelas notas vermelhas a seus pais. Ficou imaginando o que fazer, se deveria por a culpa no cachorro ou na professora. O problema era encarar os olhos do pai. Daí viria o castigo. A mãe amenizaria um pouco, mas deixaria tudo mais exigente. A irmã ficaria rindo de sua cara. Bem, isto poderia ser resolvido com um soco, mas aí tudo iria se complicar mais. Pensou em fugir pra Tocantins e viver pescando. Isso! Iria vender peixe na feira de manhã e a tarde iria pescar. E se chovesse? O rio iria transbordar e a correnteza iria ficar forte... Dava pra formar uma dupla sertaneja em Goiás.
                Sentou na calçada e amarrou uma fita no tornozelo. Sorte verde. Talvez o presidente proclamasse uma lei que obrigava a nenhum pai ver o boletim do filho. Não, melhor ainda! Era proibido existir boletim; quem se atrevesse a pensar neste papel teria a cabeça decapitada. Riu alto. Asneiras. Nada disso fazia sentido. Caminhou alguns passos e se lembrou de sua mãe ter feito uma coisa com a fatura do cartão de crédito. Parou. Sorriu. Jogou o boletim no esgoto. Tudo bem, a culpa era do cachorro mesmo.


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Um viajar

Não tendo nada por escrever, ler ou rescitar, o velho homem, de dias afim, adormeceu numa noite em que não se podia dormir. Insônia ao mundo! Mas, por ironia de um clichê, ele sonhou. Seu sonho não passou de um sonhado mal amado. Ri-se do ato vangloriado. E amou numa ressonância magnética de não Newton, ou seja lá Eistein.
Acordou para dizer que a luxúria era uma miragem não bem feita de um sol escondido numa nuvem. Alvorada.
E, no dizer do que se diz respeito, nunca mais adormeceu e amou.

Morte

Pelo visto o dia iria ser longo. Nesta manhã, só, já foram escalados mais de dez serviços e além dos integrais, que deveriam estar prontos antes das nove. Não é que estava reclamando, mas ultimamente as coisas estavam mais “rotuladas”, mas exigentes.
                Às vezes pensava em tirar umas férias, mas como ninguém poderia ou não queria cumprir obrigações, acabava desistindo e esquecendo. Por horas trabalhadas sabia que não haveria recompensa. Mas quando o serviço era bem feito, e isto sempre acontecia, lhe parabenizavam. Não necessitava desses elogios esparsos. O que fazia era necessário.
                Olhou para as montanhas. Estavam tão longe. E ainda havia aquele frio... Fazer o quê, tinha que trabalhar. Pegou o instrumento de serviço, companheiro de tantos anos e colocou-se na estrada. Todos têm que se sacrificar para poderem cumprir suas tarefas. Refletiu que poderia fazer as entregas do Papai Noel, só não saberia onde guardar a foice. Mesmo assim seria engraçado ter um sobrenome como Noel, sendo que seu nome era Morte.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Os caminhantes

 Longe se via duas sombras difusas que se movimentavam devagar, sem rumo certo. A luz da lua fazendo tudo virar prata; se vê que são dois homens, um com as mãos nos bolsos, o outro lhe falta um braço. O que conversam são assuntos de guerras remotas, de corações estourados, cérebros espatifados. Alegram-se quando relembram a tortura que promoveram naquele jovem rapaz. São coisas do cotidiano que não tem tanta importância.
 Alguns passos adiante, sentado em uma pedra com a cabeça abaixada, estava um homem. Olhou para eles lentamente com os olhos lacrimejados e vermelhos. Chamou-os. Como se não pudessem seguir suas próprias vontades, foram até ele. Aquele ermo sombrio das trevas e três homens se contemplando. Parecia que qualquer movimento, qualquer suspiro faria uma bomba estourar. Então, uma voz meio rouca, fria e calma, começou a sair daquele ser de olhos vermelhos:
 “Sentem-se, vamos... Não tenham medo de mim, não vou lhes fazer mal. Apenas quero me reconciliar com esta porcaria de mundo, com esta vida repugnante... Vida, a minha não foi das melhores, hoje a considero uma desgraça alucinante, algo tão paupérrimo que nem merece existir. Lembro quando realmente tinha uma casa, quando tinha uma família... Damos valor no que perdemos... Mas estava com medo da morte; tinha um câncer terminal que me mataria em dois meses... A loucura me dominou. Fugi. Procurei medicamentos, curas improváveis... e quando estava desesperado e totalmente exausto, aquilo veio a mim. Não disse nenhuma palavra, apenas sorriu sanguinariamente mostrando aqueles enormes caninos e se voltou para meu pescoço. Senti como se meu sangue estivesse secando e depois disso cai no chão e desmaiei, creio eu. A partir daquele dia, a sede me dominou; já não saía ao sol; abominava-o. Vivia nas sombras e na escuridão da noite, correndo atrás de vítimas que nunca mais sairiam da terra. Aquele gosto de sangue em minha boca, aquilo era um prazer imensurável. E com o passar dos tempos, notei que não envelhecia e com isso me considerei um deus. Cerca de oitenta anos mais tarde, senti falta de algo: minha família. Resolvi visitá-la, mas foi um choque para mim. A casa estava bem velha e com rachaduras. Espiei pela janela e vi um velho sentado em uma cadeira. Bati na porta e devagarzinho ela se abriu. O velho perguntou o que eu queria; respondi que procurava uma tal mulher. Ele olhou para mim e disse que ela havia morrido a uns trinta anos. Tremi... perguntei quem ele era. Respondeu. Era meu filho. Minhas pálpebras se fecharam e chorei. Aquilo era cruel. Fui embora. Para esconder minha dor, me refugiei na luxuria e na malandragem. Mesmo assim, há coisas que não tem como se apagar. A dor é terrível e persistente, e quando se tenta lançá-la aos cães, ela nos devora e deixa apenas os o pó. O que pude fazer, sozinho e sofrendo alucinações? O que me restou foi beber uma infusão de alho, veneno para os de minha espécie. Depois disso, sentei-me nesta pedra e estou esperando minha morte. Morte não. Não tenho nem alma, é só podridão de víceras e ossos”
 Dito isto, tombou em terra e morreu.

Vaso de flores

O gritinho fino da sobrinha que veio visitar os tios era assombroso. Estava naquela fase de que tudo é pergunta e por que. Por que isso? Por que aquilo? Por que não? Às vezes tentava responder as perguntas sozinha. Se não conseguia, inventava que era uma fada e que tudo era transformado por sua magia.
                Mas hoje era diferente. Queria uma resposta perfeita, não bastavam as velhas três letras. A tia veio correndo ver o que era e o que deveria ser. Suscedia-se que o tio estava sentado na velha poltrona de guerra e a sobrinha pulando no seu não-não-não! A tia perguntou o que era. A culpa era do vaso de flores. Mas o que ele haveria de ter feito, olhos de mel? Não é o que ele fez tia, é de onde ele veio. Acho que é da Terceira Dinastia do Japão. E como a senhora sabe? Quando eu o comprei de um vendedor, o vendedor me garantiu isso. E quanto que a senhora pagou? Na época foram uns duzentos reais. Nossa isso tudo? É, mas o vaso é bonito. Não sei não...

                                               ***

                Em verdade, este vaso foi feito por uma dona de casa do século XXI. Nem era para ser um vaso, mas acabou saindo e ficou assim. Mas essa dona de casa não gostou do vaso e o vendeu a uma menina por cinqüenta centavos. A menina deu o vaso para o pai, que o re-pintou e o vendeu numa loja de antiguidades por três reais e cinqüenta centavos. Então um caixeiro viajante o comprou por quatro reais e o revendeu por R$200,00, alegando que era da dinastia chinesa, que acabou sendo confundida por um vaso japonês.

                                               ***

No outro dia a sobrinha, meio injuriada pelo mal tempo, esbarrou no vaso que caiu no tapete. Uma pequenina lasca se soltou do objeto. No fim a lasca entrou no pé do tio, que inflamou e precisou fazer uma pequena cirurgia. No vaso de flores foram colocadas margaridas.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Soneto trabalhado

As mãos cansadas e oprimidas
Os olhos vazios e perdidos
Os pés tortos e doloridos
A cabeça com dores reprimidas

Nos calos feitos pelo tempo
Há lembranças amarguradas
Pois por vias injuriadas
Se desgasta num lamento

O rosto seco e envelhecido
Sem nenhum tipo de suporte
Luta em um chão enegrecido

Não tendo ninguém que o conforte
Será para sempre esquecido
Num lance incerto para a morte.

Soneto ao mestre Guimarães Rosa

A primeira palavra escrita, nonada
Seria um tudo para uma visita
Pois seu anfitrião não grita
Numa narração não acabada

Mas Riobaldo não pára de falar
Suas memórias tropeçam nas veredas do ir embora
E se levantam refletindo no agora
Sem saber aonde se extraviar

No fim os jagunços tremendo
A guerra era só para quem queria
E a pólvora foi ao sangue absorvendo

No tudo Zé Bebelo se delicia
Na morte que Diadorim morre morrendo
E na última palavra escrita, travessia.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Soneto erotizado

Quero te jogar na cama
Rasgar tua roupa com os dentes
Beijar seu corpo em coisas eloqüentes
Te deixar totalmente insana

Os corpos se entrelaçam num baile vertical
Num movimento sem no quê de onde acabar
Em tudo calor, suor e falta de ar
O prazer inexorável na conjunção carnal

Movimentos curtos, suaves, ofegantes
As pálpebras se fecham na escuridão
As mãos estão trêmulas e alarmantes

Os corpos estão cansados na sua sólida não solidão
Batalham o fim da batalha dos amantes
Foi tudo consumado no gozo da paixão.

Menina bailarina

Saltos insanos de uma menina descalça. Nas pontas de seus pés ela rodopiava, fazendo seu vestido, no seu não querer azul, se inflar e girar. Os pequenos babados da borda subiam e desciam. Ela ria. O laço de fita amarrado na cintura a acompanhava freneticamente no seu amarelo amarelado. As pernas finas e brancas como a lua, não paravam de bailar no chão de taipa fria. Os braços ondulavam aos sinais do vento. Iam e vinham. Os dedinhos tocavam um piano imaginário, que soava suas notas tão depressa e belamente harmonioso, que se consentia um cristal se quebrar. Quanto muito, o joelho tocava o chão e aquela dor a fazia gemer, de forma que chorava. Mas limpava o rosto com a mãozinha e punha-se a saltar novamente.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Os amantes

Somos amantes,
Amamos-nos apenas pelo olhar
Nossas íris refletem a cor do desejo
Enquanto as pupilas dilatam-se no prazer,
O corpo incendeia na luz vermelha
Até que tudo se apaga e então no beijamos
Os lábios estão fechados
A língua está imóvel
Beijamos-nos através do vento...
Vento brisa
Sentamos um de frente ao outro
Então fizemos amor com os olhos...
As pálpebras não se fecham
As sobrancelhas estão serenas
E o globo ocular estático...
Estático no seu observar
Tudo pode acontecer, não temos medo
Medo seria ficar cego.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Soneto pedido de namoro

Esse é o dia escolhido
Já não posso mais esperar
Minha vida nunca vai parar
Não posso pedir para se requerido

Faz tempo que planejei tudo
O problema era a coragem que não vinha
Os argumentos que não tinha
E o medo de ficar mudo

Mas não tinha como ir embora
Tinha que deixar a alma renovada
E não podia ser em outra hora

Olhei para os olhos de minha amada
Pensei: “é agora”
Quer ser minha namorada?

domingo, 1 de janeiro de 2012

Feliz ano novo

No fim, acaba em horário demarcado pelo tempo
Assim fazendo folia em luzes que brilham no céu.
Alguns minutos se passam em uma bebida efervescente
Enquanto um “feliz ano novo” ressoa no ar...
Devagar, em algo não ensaiado, apertos de mãos, abraços e beijos surgem
E nesse surgir se vê uma centelha de amor...
Amor que sempre queremos que se misture no branco eterno da paz.
E quando isso acontece, nos olhos de todos os que olham para o céu se vê escrito:
“Mais um ano que tenho de vida, mais uma oportunidade de correr atrás de meus sonhos”
E do branco da paz, surge algo verde e encorajador,
Algo que sempre vem em momentos sombrios e esquecidos...
O último de todos os sentimentos: a esperança.
Esperança que sempre nos proporciona mais e mais aquela vontade de sempre tentar.
Tentar, sorrir...